domingo, 30 de março de 2014

OSCAR 2014 - Belo Passeio de Gravidade, com Triste Desvio de Rota ao Fim da Viagem




 Belo Passeio de Gravidade, com Triste Desvio de Rota ao Fim da Viagem


 por Fábio Dantas
McConaughey, Blanchett, Nyong'o e Leto: performances laureadas


                   Ano passado, ano de Argo, de Ben Affleck, a Academia cometeu tantas erros e gafes, excluiu tanta gente boa – como o próprio Affleck na categoria de Direção, causando uma comoção/indignação poucas vezes vistas na História – e incluindo outros bem duvidosos – como o engodo Indomável Sonhadora (Beasts of the Southern Wild) – que todos os analistas apostavam em um conservadorismo crasso este ano, uma espécie de seleção segura e conservadora, fugindo ao máximo de riscos. Isso nunca é bom, e como esperado, o resultado final foi decepcionante.

Ellen tem poder: o selfie da História

                    Em um ano com belas obras de autores, como Ela (Her), o conto de fadas futurista/análise do mundo moderno onde predomina a solidão, de Spike Jonze e Nebraska, o inventário afetivo permeado de nostalgia de Alexander Payne, a disputa de fato se estabeleceu entre Gravidade (Gravity), de Alfonso Cuarón e 12 Anos de Escravidão (12 Years a Slave), de Steve McQueen. Gravidade, obra-prima de Cuarón, filme que propõe o embata entre homem vs máquina, que consegue aliar simultaneamente técnica excepcional com uma narrativa que investiga o ser humano, formando um todo irresistível, foi  grande vencedor da noite, ganhando sete estatuetas. Porém, não levou o prêmio de melhor filme, que foi para 12 Anos de Escravidão. De certo modo lembrou 1972, quando O Poderoso Chefão (The Godfather) e Cabaret dividiram os prêmios principais, com três e oito estatuetas, respectivamente. A comparação não se sustente apenas por um único – e definitivo – motivo: 12 Anos de Escravidão não é um grande filme.

12 Anos de Escravidão: filme frio e estéril tira o prêmio máximo de Gravidade

         12 Anos de Escravidão é um filme frio, estéril, burocrático e sem força, o extremo oposto do que seu tema dramático e pungente exige.  Os defensores do filme pregam que é o filme mais importante do ano, é um filme necessário, já era tempo de premiar o tema. Contudo, nenhum diz que é um grande filme, que é um trabalho ímpar, uma grande obra cinematográfica. Simplesmente porque não é. Ao aderir às cotas raciais, ao ceder à campanha “It´s time” a Academia retrocede e dá mais um passo em falso e premia um filme meramente mediano por questões alheia à qualidade intrínseca da obra.

          Todos os prêmios para Gravidade são inquestionáveis, sobretudo o de Alfonso Cuarón, o Maestro que rege a sinfonia de silêncios e imersão profunda que o filme é. Bravo! bravo! bravo!
 
Alfonso Cuarón com seus dois Oscars, de Direção e Montagem por Gravidade

                        
            Dentre os intérpretes, equivalências distintas entre os vencedores. Cate Blanchett, gigante surgida no final dos 90’s com Elizabeth, é uma das raras unanimidades reais dentre as atrizes da atualidade. Com a grande vantagem de escolher sempre os filmes certos e nunca entrar em projetos duvidosos, como vários colegas fazem com certa frequência. Sua vitória em Blue Jasmine, do Mestre Woody Allen – que neste ano atingiu a inacreditável marca de dezesseis indicações como roteirista, com três prêmios – era uma das mais certas nos últimos anos. É uma performance extraordinária, que modula com precisão as múltiplas nuances e oscilações de sua Jasmine – mezzo Blanche DuBois, um personagem de complexidade ímpar, atingindo um resultado assombroso e inesquecível. Blanchett já havia ganhou seu primeiro Oscar como atriz coadjuvante interpretando a lendária Katharine Hepburn em O Aviador (The Aviator), de Martin Scorsese. Justiça para uma atriz que é quase um milagre e das poucas que de fato pode atingir o topo do patamar da imortalidade plena que só os gênios absolutos podem almejar. Blanchett é uma atriz transcendental. 

 
Cate Blanchett: Atriz Transcendental com performance antológica em Blue Jasmine

                  Matthew McConaughey venceu como Ron Woodroof, eletricista mulherengo, machista e ignorante que descober ser soropositivo em Clube de Compras Dallas (Dallas Buyers Club), filme bem-intencionado e de resultados razoáveis. É uma boa performance, embora calcada na fórmula desgastada da transformação física. Definitivamente, uma vitória para as performances intensas – na expansão e introspecção, respectivamente – de Leonardo DiCaprio em O Lobo de Wall Street (The Wolf o Wall Street) e Bruce Dern em Nebraska deixariam tudo mais nobre e justo. Jared Leto, colega de filme de McConaughey, venceu como ator coadjuvante e uma análise atenta deixa evidente como a construção de personagem dos dois atores está a anos-luz de distância. Leto entra em um processo de imersão em sua Rayon que vai além de transformação física, gestual ou vocal. Ele imprime alma e personalidade valiosas a u personagem que poderá facilmente cair no caricatural. Feito notável para um ator até então de resultados – e oportunidades – modestos. Completando a lista, Lupita Nyong’o venceu como atriz coadjuvante por 12 Anos de Escravidão. Pode-se dizer que foi uma das vitórias mais fáceis em muito, muito tempo, pois Lupita, com exceção da cena do sabão, não faz praticamente nada durante o filme, sequer tem boas cenas ou momentos de destaque. A última cena de sua personagem parece uma alegoria: ao ver Solomon (Chiwetel Ejiofor) partir rumo à liberdade, ela sai de foco em cena enquanto cai no chão. A personagem é basicamente isso, um borrão. E embora a atriz esteja se tornando ícone fashion, acabou se aproveitando pela categoria estar totalmente emaranhada, com candidatas potencialmente não premiáveis – caso das duas performances mais fortes da categoria, de Julia Roberts e Jennifer Lawrence.

                    
Matthew McConaughey: 30 kg a menos e um Oscar por Clube de Compras Dallas
 
Jared Leto: brilhante como o transsexual Rayon em Clube de Compras Dallas
Lupita Nyong'o e seu Oscar por 12 Anos de Escravidão

                  Spike Jonze venceu seu primeiro Oscar de Roteiro Original por Ela. Merecidíssimo e mais que esperado, enquanto John Ridley venceu por 12 Anos de Escravidão, batendo concorrentes muito mais fortes como Richard Linklater, Julie Delpy, Ethan Hawke pelo belíssimo Antes da Meia-Noite (Before Midnight). O italiano A Grande Beleza (La Grande Bellezza/ The Great Beauty), de Paolo Sorrentino vencendo como Filme Estrangeiro e Frozen- Uma Aventura Congelante (Frozen), de Chris Buck e Jennifer Lee, dando mais um prêmio de Longa de Animação para a Disney, confirmaram seu favoritismo. Este último venceu também o prêmio de melhor canção original, Let It Go, de Kristen Anderson-Lopez e Robert Lopez, interpretada pela diva da Broadway Idina Menzel.

O diretor Spike Jonze e seu Oscar de Roteiro Original por Ela

Idina Menzel entoa a belíssima Let It Go, de Frozen
                  No computo geral, em uma ano que trouxe obras tão fortes e díspares, houve muitos premiados com justiça. Pena que alguns dos principais prêmios, inclusive o de melhor filme, tenha ido para um filme impessoal, que causa mais distanciamento do que identificação com o pungente drama que narra. Vitória por conta de cotas raciais e postura politicamente correta é uma vitória pálida, sem brilho. O que, ironicamente, condiz com o filme.

2 comentários:

  1. Concordo com quase tudo, exceto com relação a 12 anos de escravidão, não achei injusta a vitória, apesar de estar torcendo por gravidade, 12 anos de escravidão é um filme forte, e como gravidade já levou melhor diretor, obviamente o filme de Steve Mcqueen iria levar o de melhor filme, a academia tem uma lógica, se entender essa lógica da pra prever quem ganhará
    By: Servolo

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  2. Ah Rafa, esse "12 Years" anêmico e insípido não dá.

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